Lições da manifestação dos policiais no RJ
O Rio de Janeiro está no caos e não é de hoje. Como lá eles têm facilidade para transformar pequenos eventos em grandes realizações, com holofotes e pirotecnias, faz- a quem está de fora - acreditar que o drama e a comédia têm relacionamento fixo, e tudo vai bem. Mesmo havendo um deslize aqui e outro ali, de parte a parte, não são suficientes para atingir a relação de forma substancial, a ponto de levar a uma ruptura que chegue ao divórcio.
Quando a observação é mais apurada e alcança o que a fantasia criada procura esconder, chega-se à conclusão de que a única instituição que manteve e mantém o estado equilibrado neste slackline mortal foram e são as instituições policiais em que pese todo escárnio que sofrem ao longo dos anos.
O policial é resiliente, todavia, quando mexem no seu salário e consequentemente afetam a sua família, o caldo entorna. Nenhum regulamento disciplinar castrador segurará uma turba enfurecida. Não bastasse isso, como mostra da nova mentalidade que já está alcançando as polícias, graças a Deus, o comandante geral da PM carioca autorizou seus subordinados a se manifestarem, como tem direito todo cidadão.
Na última terça-feira (8/11), participaram de uma manifestação na frente da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, em que se reivindicava a não aprovação de uma proposta do governo de reduzir salários em até 30%, entre outros, conhecido como “Pacote de maldades”. Num dado momento, enfurecidos pela recusa de serem recebidos pelos parlamentares, decidiram invadir o Palácio Tiradentes e, além de vandalizar gabinetes de deputados, subiram até na mesa da presidência e, assim, cometeram atos que, por ofício, sempre combateram.
Apesar da imagem de força que ostenta, o policial é vulnerável. Tem nome, sobrenome, endereço, farda, escala de serviço, rotina e regulamento disciplinar rígido. Bandido não. Tem de todo jeito. De terno, batina, toga, com imunidade, influência, anônimo e famoso, com e sem poder, nos palácios e nos barracos... São muitos e estão por todos os lados. Por isso nosso poder não está na farda e nem sequer na arma que portamos, muito menos na truculência e nas ameaças de que “acabou o amor”, e “isso aqui vai virar um inferno”. Nosso poder está na ação inteligente, aquela que não aceita manobras nem infiltrados, não aplaude falsos representantes, construídos e ou mantidos pelos opressores, que fazem o “alho e óleo” para ser visto como quem luta pela classe, mas nos bastidores reza no mesmo livro dos cardeais.
Enquanto isso, ficamos socando a ponta da faca e reclamando que está doendo, acreditando que conseguiremos dias melhores porque a luta e visível e as dores, sentidas.
Para sermos respeitados, temos que dar o respeito; mais que isso, mostrar de forma inteligente que estamos recebendo menos que a nossa importância exige. Fazer diferente disso é nivelar os atos aos que protestam queimando pneus e ateando fogo em ônibus e vê, no dia seguinte, a situação inalterada.
Temos que fazer a sociedade lutar por nossos direitos. Apesar dela não nos respeitar nem reconhecer publicamente nosso valor, sabe que dependem do nosso trabalho senão sentirá o impacto, as consequências.
O jornalista Pedro Bial foi um dos que correu em socorro da polícia quando, em 2006, o crime organizado iniciou uma série de atentado em São Paulo, causando pânico e temor na população, vitimando vários policiais. Na abertura do fantástico daquele domingo leu um editorial "Quando erram, nós não os perdoamos. Somos, frequentemente, implacáveis com eles. Até que, num fim de semana trágico, vislumbramos o que seria de nós sem a polícia. Aos mortos, e aos vivos, o Fantástico faz um tributo”.
Que temos força, idealismo, coragem e valentia, todos já sabem. Para sermos respeitados e termos uma profissão reconhecida e com tratamento digno, o país precisa também conhecer a nossa inteligência.