terça-feira, 26 de novembro de 2019

GRITO SUFOCADO

Sargento Lago

Apenas um minuto não bastaria. Demandar-se-iam horas debatendo o tema. Mas apenas segundos seriam suficientes para fechar questão: o sagrado direito à liberdade de expressão deve ser garantido já aos policiais militares. 

Nesta semana soube que mais um policial militar paulista pode perder a condição de reformado e os seus benefícios e juntar-se ao colega demitido no ano passado por vociferar seus descontentamentos contra um parlamentar. 

Não vou entrar no mérito se houve ou não exageros nas críticas. Até defendo o direito do ofendido de buscar reparação para a sua honra ofendida. Porém, a disparidade entre direitos e obrigações salta aos olhos, e a imposição de resignação advinda destas potencializa a humilhação de uma classe cuja lealdade ao cidadão e aos mandatários mantém-se inexpugnável. 

Doamos o nosso máximo à instituição e, às vezes, não recebemos dela o mínimo. No caso em questão, o mínimo que queremos é ter direito a opinar. Com paixão, como fazemos no futebol, porque na política a paixão vem acompanhada de indignação e decepção, produtos deletérios de atuações parlamentares questionáveis. 


Entendo até que, como todo cidadão, quem exagera na crítica - entrando no campo da calúnia, difamação e outros crimes – como todos, deve ser responsabilizado na justiça comum, mas não na esfera militar, visto que a relutância dos parlamentares em promover alterações do regulamento disciplinar revela-se uma postura abjeta, que seria legislar em causa própria. O RD aplicado aos reformados transforma os representantes políticos oriundos da Corporação entes isentos de reprovação, diferenciados dos demais na mesma condição e obrigados a dar satisfação de suas atuações políticas aos eleitores. 

Protelam-se ao máximo aos policiais militares os avanços que toda sociedade já conquistou há algum tempo. Enquanto os direitos trabalhistas e a criminalização dos preconceitos alcançam todos, perdemos direitos dados como garantidos e somos vítimas diariamente de preconceitos, sem o amparo das leis rigorosas, como filhos órfãos. 

No caso dos inativos, não vejo razão para que seja mantido o rigor do regulamento. Não apenas por já terem cumprido suas missões com louvor, o que já seria o suficiente para justificar a isenção, mas também por verem frequentemente suas conquistas, que julgavam asseguradas, diluídas a cada reforma feita. E quem poderia brigar para garanti-las está distraído com seus próprios interesses. 

A fragilidade gerada com a perda dos direitos tornam algumas obrigações, como a proibição de opinião, uma tortura para todos. 

Quando vão considerar a ciência, que orienta como terapia falar sobre os problemas que lhes afligem, para evitar complicações sérias na saúde física e mental? O desabafo nas redes sociais acaba sendo a única terapia disponível ao policial. Considerando as limitadas vagas disponíveis para atendimentos médico e psicológico, é a válvula de escape. 

Todos civis podem criticar os políticos abertamente, alguns até com exageros, e quase sempre sem represálias. 

Recentemente vi policiais militares de alto coturno criticando abertamente o governador, e não tivemos conhecimento se providências foram tomadas. Não que eu desejasse, pois defendo que todos tenham o seu direito de opinião assegurado. Mas os casos do sargento e do soldado, reclamados pelo parlamentar, geraram procedimentos disciplinares e ganharam publicidade. Pareceu-me que foi para servir de exemplo e inibir outros descontentes. 

Desejo que os parlamentares da “bancada da bala”, que têm feito muito alarido e produzido pouco ou nenhum resultado positivo para a nossa tropa, abracem essa sugestão: promovam um debate democrático com o público interno sobre as regras atuais, que reclamam reformas, e proponham as mudanças que vão tirar mais esse peso do ombro cansado do guerreiro, já que aqueles, os parlamentares, já demonstraram não disporem de influência política, tampouco de estofo para reivindicarem a coerência e a justiça necessários nas negociações referentes ao nosso aumento salarial.

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