Julgamento de Celso Lungaretti
Tenho contato eletrônico com uma
pessoa que escreveu sua história na militância política do país quando ainda
era um jovem de 17 anos, no tempo da ditadura militar.
Há cerca de três anos, mantive
contato com ele para entrevistá-lo e saber um pouco sobre os acontecimentos
daquela época, já que havia sido contemporâneo de Carlos Lamarca, e a minha
pesquisa era sobre Alberto Mendes Junior, herói da PM paulista, morto por
guerrilheiros comandados pelo oficial desertor do Exército Brasileiro.
De tudo que me contou, Celso
Lungaretti, que escreveu um livro autobiográfico com o título “Náufrago da
Utopia”, pareceu-me uma das poucas pessoas da sua época fiel ao que sonhou.
Embora tenhamos divergências ideológicas
e também não acredite que eles (os militantes) tenham sido tão heróis e os
militares tão cruéis (embora tenham sido), como ele apregoa, há uma coisa em
Lungaretti que admiro: a fidelidade as suas convicções.
Minha constatação deveu-se a uma observação
pessoal. Com menos tempo de ideologia que ele, tenho observado coisas na
polícia que diferem das que acreditei, e isso me desestimula a continuar
defendendo a bandeira da corporação. Veja bem,
desanima, mas não quer dizer que deixarei de fazê-lo. Devo essa mantença a
atitudes como esta de um ex-militante que, mesmo vendo seus antigos parceiros
se beneficiarem da virada política e mostrarem-se tão corruptíveis quanto ao
regime que combatiam, permanece determinado na defesa do seu ideal.
Recebi um e-mail dele informando
que será candidato a vereador em São Paulo, pela primeira vez (sou cadastrado
no blog para receber seus textos), e enviei-lhe uma mensagem desejando boa
sorte no seu projeto. Na resposta que me enviou, disse:
“SE GENTE COMO EU NÃO SAIR DA
TOCA, OS JOVENS PENSARÃO QUE ÉRAMOS TODOS ZÉS DIRCEUS.”
A postura de Lungaretti soou não apenas como um alerta no meu momento de desencanto, mas como um veredito silencioso: há que se continuar na defesa de nossas instituições policiais apesar do surgimento de um novo vendilhão dos quartéis a todo instante, aqueles que contabilizam obrigações como feitos relevantes, mas não passam de verdadeiros sanguessugas que ignoram o esforço dos seus pares e colocam-se como bastião dos interesses do povo, com foco apenas nos interesses pessoais. Como esquecer os que jogavam para a torcida enquanto escondiam o jogo duplo que faziam em benefício da minoria? Agora é hora de reconhecer os que querem se passar por bonzinho para a maioria. Por isso é preciso vigiar, refletir para ousarmos a ter a consciência de que talvez já tenhamos vendido a esses mensageiros de engodos o resto de nossas esperanças.
É meu povo, o mundo não apresenta
novidades, tudo isso é antigo. Apenas nós vamos adquirindo o discernimento, que
na verdade traz mais dor que alívio; entretanto, também traz grandeza, como
pude observar nas convicções de Lungaretti.
A noção de nossa responsabilidade é dolorosa,
pois o comprometimento institucional que adquirimos acaba sendo ruim, pois
buscar a verdade requer a coragem para ir além do lodo, e eu jamais sairia por
aí jogando lama no ventilador que um dia me refrescou.
Acho que vou ficar como o
Lungaretti, navegando nas águas turbulentas da minha utopia, mas com o consolo
de ter no travesseiro um cúmplice que me permite um bom sono ao deitar.