Gilberto Amendola – Jornal da Tarde
Pra não dizer que não falei da polícia
Profissão Coragem, o CD do sargento Lago, não é confortável de se ouvir. Não porque seja ruim. Nada disso. Lago tem uma voz ‘ok’ e a produção é bem caprichada. Além disso, artistas de peso participaram do projeto, como Dominguinhos, Benito di Paula, Jair Rodrigues, Marcinho Art, o grupo Planta e Raiz e outros. O principal arranjador do disco é Pelezinho, nome conhecido no mundo do pagode.
O que incomoda o ouvinte civil (que não é policial ou parente de um) é o discurso pró-policia. É como se Lago subvertesse a música de protesto dos anos 60/70 e do rap dos dias atuais. Em vez de crítica, elogios ao aparato policial. Isso é um problema? Talvez não. Mas, convenhamos, é um preconceito difícil de se vencer.
O teste de fogo é a versão de Pra não dizer que não falei das flores. Nem adianta dizer do estranhamento de ouvir um policial cantando um dos hinos da esquerda contra a ditadura militar. O próprio Vandré, arredio a homenagens, gostou da versão.
O rap PM Bom de Bola deve doer no ouvido dos manos. A faixa parece feita por um Marcelo D2 careta e deslocado. Não cola. Sou Gambé, com a participação do planta e Raiz, pega pesado no verso “Eu sou corintiano, mas não sou maconheiro/Eu curto Bob Marley, mas não sou maconheiro...”
Em Soldado Se Queira, chama atenção a história de um policial que cai na bebida e nas drogas: “Seus planos agora foram esquecidos/Diluiu pelo ralo o que era pros filhos/Ganhou eloqüência pelo grau etílico/Mas sem o bom senso ficou tão ridículo...”
Uma curiosidade sobre o disco é como Lago conheceu o principal arranjador do seu trabalho, o Pelezinho: durante uma batida policial. “Foi uma coisa de rotina. Na hora, reconheci o cara.”
- Publicado no Jornal da Tarde de 4/2/09